Dream News (DN) – O gosto pela criação de vestuário foi-lhe incutido pelas suas avós? Que memórias tem de aprender a usar as máquinas de costura da altura?
Frederica Gesteiro (FG) – Sim, este gosto pela costura, (não só mas também), tem a ver com o facto de ambas as avós, materna e paterna, terem como passatempo/necessidade, a costura como uma atividade nas suas lides caseiras. Nessa altura, ainda miúda, costumava observar e às vezes pedir-lhes para me ensinarem uma ou outra coisa… sempre na perspetiva de poder vir a fazer um closet para as minhas barbies. As memórias das máquinas, o pedalar e o barulho que faziam estão ainda tão presentes na minha memória. Sim, era nas férias, que me deliciava a ver como de um simples tecido, surgia um vestido, uma blusa, um casaco…então, no chão da garagem, recortava pedaços de tecidos de eventuais sobras e mais ou menos, melhor ou pior lá ia dando uns pontos, sob o olhar deliciado das minhas queridas avós. De todas estas memórias, há uma, que está e estará para sempre no meu imaginário…o casamento da Barbie com o Ken… sim, o dia em que a avó Augusta sugeriu fazermos um vestido de noiva para a minha Barbie… Meu Deus, que sensação aquela… a minha Barbie ia casar e eu e a avó Augusta íamos tratar dos trajes. Lembro-me que passamos a tarde toda com esta criação e que este dia foi de uma enorme importância para o meu futuro como criadora de moda.
DN – A licenciatura em Design de Moda deu-lhe o impulso teórico-prático que necessitava para conceber e realizar, desde o zero, coleções inspiradoras?
FG – Adorei o meu curso, tive professores muito exigentes que me obrigavam a esforçar-me muitíssimo, mas também sei que foi graças a essa exigência que percebi que era realmente esse o meu caminho. Quando terminei o curso rapidamente entendi que queria montar a minha própria marca. Nesse momento, as minhas coleções eram muito criativas e pouco comercias. Desejava imensamente mostrar a minha arte, e mesmo achando/receando o mercado laboral, fui em frente.
Cada vestido passa por um processo de provas
Frederica Gesteiro
que normalmente demora dois meses.
DN – Os seus primeiros passos foram dados em Barcelona. Pode descrever, o percurso que percorreu no país vizinho? Na cidade Condal, fundou marcas próprias e participou em imensos eventos. Qual é o balanço que faz dos primeiros passos?
FG – Barcelona foi uma grande aventura, quando optei por esta incrível e deslumbrante cidade, era para uma estadia de (no máximo) três meses, tempo necessário para o estágio e consequentemente finalizar a minha licenciatura em Arquitetura de Moda, pela Universidade de Arquitetura Tomás Taveira. Mas, não foi bem assim, Barcelona acabou por ser a minha casa durante 15 anos. Nesta cidade tudo era mágico, as coisas aconteciam de forma estranha e apetecível. Lembro-me que fiz uma instalação, para apresentar a minha primeira coleção e de repente estava a fazer o meu primeiro desfile na discoteca mais badalada da altura. Acho que grande parte da magia, se deveu ao facto de ter tido a sorte/mérito de um grande estilista (alta costura) francês, de seu nome Ludovick Charmont me ter convidado a trabalhar consigo…aí sim, penso que foi mesmo nesse momento que se deu o pontapé de saída. A empatia foi grande e rapidamente eu estava deslumbrada com o profissionalismo e arte da-quele senhor. Acabei o estágio e ele quis que continuasse com ele, e assim foi. É também a ele que devo a criação da minha primeira marca de roupa, a Paprika… e foi no Bairro Gótico, um dos mais emblemáticos bairros históricos de Barcelona que nasceu a Paprika. Depois veio a crise em toda a Europa e em Espanha não foi diferente. Seria então altura de ter um trabalho dentro da minha área sim, mas mais seguro e estável. Comecei como estilista online para uma marca de sapatos, e, no entretanto, encontrei um trabalho como agente comercial têxtil na empresa Double G. Esta empresa tinha as duas vertentes, tecidos e confeção de roupas. Aqui tive a grande oportunidade de conhecer o fast fashion. Trabalhei com marcas como Massimo Dutti, Uterque, Mango, Desigual, ECI e Stradivarius… Era um trabalho entre o design (que executava para as várias fábricas com quem trabalhava) e o comercial, levando essas mesmas peças aos compradores do grupo Inditex, entre outros. Era um trabalho bastante lucrativo, mas ao mesmo tempo muito cansativo pelas constantes viagens (que era obrigada a fazer) aos diversos países onde se encontravam as respetivas produções das fábricas que representávamos.

DN – Como e quando surgiu a ideia para criar o Frederica Atelier?
FG – Foi todo um processo, eu diria que tudo começou com o desenho e criação do vestido de noiva de duas das minhas melhores amigas. Depois a palavra foi passando, vieram as amigas das amigas, as primas, as amigas das primas e engrenou… Mas, acho que o click final, foi quando decidi que ia fazer o meu vestido de noiva. Mais tarde, em 2019, este sonho começou a materializar-se e abri o meu primeiro atelier de noivas no centro de Barcelona.
DN – O que a moveu para deixar Barcelona e implementar o seu atelier, em Lisboa, em 2021?
FG – As circunstâncias pandémicas empurraram-nos para Portugal e foi em Lisboa que surgiu a oportunidade de continuar o projeto, mais concretamente na zona do bairro dos atores, perto do Areeiro, onde montei o meu atelier.
DN – O Frederica Atelier está focado no desenho e produção de vestidos de noiva exclusivos? Qual é a filosofia do Frederica Atelier?
FG – Combinamos o trabalho técnico com intuição criativa. Trabalhamos tecidos que nos permitem aliar, de forma inovadora, a sofisticação e o conforto, criando modelos que se adaptam à imagem e personalidade de cada uma das nossas noivas na sua infindável diversidade. Cada projeto pressupõe começar do zero, por isso a parte da pesquisa, procura, compor e recompor até encontrar o modelo perfeito que corresponda às expetativas e que ao mesmo tempo, se harmonize de forma natural, com as suas características físicas e a sua personalidade. Esta é a nossa filosofia de trabalho.

DN – Onde se inspira para criar vestidos únicos que tornam as noivas autênticas musas?
FG – Procuro inspirar-me em tudo o que me rodeia. Séries, filmes, nas revistas de moda, nas viagens que faço, numa saída à noite… Tudo pode ser inspirador e motivo para que surjam grandes ideias. Queria só ressalvar, que quando criamos os nossos exclusivos, nos embrenhamos na história e personalidade das nossas noivas. Algumas, ou muitas conversas, são precisas para percebermos ao pormenor mais ínfimo, todos os detalhes desse casamento. Estilo de cerimónia, decorações escolhidas e até mesmo os detalhes da história que os leva a esse dia, o do casamento.
DN – A partir do momento em que o noiva a contacta, como decorre o processo de criação do vestido ideal para o dia mais especial da vida?
FG – Normalmente tudo acontece na primeira visita. Nessa primeira conversa, tentamos conhecer a pessoa que está por trás da futura noiva, quem é, o que mais a motiva no seu dia a dia, os seus gostos pessoais em relação a vários temas e planos já estão estruturados ou pelo menos pensados para o seu casamento. Numa segunda etapa, vamos vestir protótipos. Temos vestidos das várias coleções, assim como saias e tops a partir dos quais vamos fazendo montagens, selecionando tecidos e dessa forma construindo um puzzle que irá dar origem ao vestido da nossa noiva. Por último finalizamos com um desenho digital onde va- mos plasmar tudo o que descobrimos na nossa reunião.
DN – Normalmente, utiliza que tipo de materiais? Quais são as tendências atuais ligadas aos vestidos de noiva?
FG – Os nossos básicos mais usados são o duchesse, crepe; chiffon, tule e alguma seda natural. As rendas e os tecidos de fantasia também são muito procurados. Este ano as mangas bufantes, os corpetes e os vestidos com toque rustico são os mais pedidos.

DN – Quanto tempo demora para produzir um vestido de noiva deslumbrante?
FG – Depende sempre muito da ordem das entregas. Cada vestido passa por um processo de provas que normalmente demora dois meses.
DN – Qual é o feedback que tem obtido por parte das noivas com quem tem trabalhado?
FG – Acho que é muito positivo. Tenho mensagens que nos emocionam onde sentimos que vale mesmo a pena fazer parte deste processo tão bonito e deixar que um pedacinho do nosso atelier vá com cada uma das nossas lindas noivas.
DN – Sente-se feliz por ter criado um projeto inspirador que visa dar felicidade às noivas?
FG – Estou extremamente feliz por ter criado um projeto inspirador com o objetivo de trazer felicidade através dos nossos vestidos. Tenho a sorte de já ter experimentado todas as vertentes da área de moda e sei que esta é, sem dúvida, a que me deixa mais realizada. É, sem dúvida alguma, um enorme e emocionante reconforto fazer parte desse processo…O Yes to the dress, com as emoções ao rubro, não apenas das noivas, mas também de quem as acompanha, (mães e madrinhas), é uma sensação única, enche-me de felicidade e faz-me agradecer todos os dias por ter escolhido esta vertente específica do design de moda.